Apesar das exigências do mercado, classificar um perfil como "Torra clara", "Torra média" ou "Torra escura" é ultrapassado e causa mais confusão que solução. 

Virou um senso comum definir que um café de torra clara é delicado e com alta acidez, um de torra escura é intenso e amargo e uma torra média resulta em um café equilibrado, porém isso além de errado (como veremos) não quer dizer muita coisa. 

É claro que a torra faz a diferença! Assim como se um mesmo café (um mesmo lote de café) tiver cores diferentes, a bebida vai ter notas sensoriais diferentes! A cor, inclusive é um excelente controle de qualidade. Se um determinado café, após seu processo de torra não atinge uma cor específica, ele não terá o mesmo resultado sensorial. 

O que as pessoas (isso inclui a grande indústria) confunde, é que só a cor não é uma garantia de um perfil sensorial específico. Alguns cafés podem ser que fiquem melhor com uma "torra escura" enquanto outros fiquem melhor com uma "torra clara". 

Isso porque, cafés diferentes tem composições químicas e estruturas diferentes. Logo alguns cafés mesmo com torra clara, já podem apresentar um sensorial de queimado, enquanto outros cafés com torra escura podem não apresentar amargor excessivo, clássico de cafés de torra escura. 

Hoje além de termos expandido muito a quantidade de variedades de cafés, estamos explorando novas áreas, mais altas ou baixas, e também novos métodos de pós colheita. Tudo isso interfere na cor "natural do café" o que eu quero dizer com cor natural, é justamente que o café em um perfil de torra adequado (sempre pensando no especial) pode apresentar um padrão mais escuro ou mais claro. Por exemplo, cafés de baixa altitude tendem a ficar mais claros, e se você tentar torrar ele até ficar uma "torra média" ele provavelmente já terá notas de café queimado no sensorial, que seria atribuído à uma "torra escura". 

A cor para quem não está tão inteirado no meio, é medida através de equipamentos de precisão. A escala mais comum usada no café é a Agtron, que vai de 0 a 100, onde 0 é muito escuro e 100 é muito claro. Essa escala tem uma variação grande, que faz com que cafés que tenham variações consideráveis de cor na escala e no resultado sensorial, tenham essas diferenças imperceptíveis a olho nu. Ou seja, um café de "Torra média" pode ter diferentes sensoriais (e valores em agtron) dentro dessa mesma classificação média. 

Técnicas de torra extrema também podem causar confusão, gerando amargor em cafés claros ou acidez alta em cafés de tom mais escuro. 

Então torras feitas por provadores ou campeonatos que o critério para ser considerada aceitável é a cor do café é péssimo! Estabelecer uma cor específica de torra pode até favorecer a maioria dos cafés, mas alguns cafés podem ficar melhor mais claro enquanto outros mais escuros, e isso compromete significativamente a avaliação desse café!

Enquanto isso recentemente a norma de embalagens (não se aplica a maioria das torrefações artesanais) passou a exigir a descrição da cor da torra. Inútil! 

Então a busca do café não é pela cor, mas pelo sensorial. Se você quer um café com alta acidez, não procure uma torra clara, procure simplesmente por um café com alta acidez! É mais provável que você encontrará um café subtorrado, enquanto poderá perder a oportunidade de encontrar uma alta acidez em um café bem torrado mas que tenha uma aparência mais escura ou vice versa. 

Compre café que seja bom para tomar, não para tirar foto dele! 

Abraços! Gabriel Carvalhaes Heinerici